segunda-feira, 3 de dezembro de 2018

As Portarias de Extensão e a Sindicalização

 
Devem ou não os trabalhadores não sindicalizados, abrangidos por portarias de extensão, pagar os custos da negociação coletiva efetuada?

A esta pergunta, respondo sim!

 As Portarias de Extensão embora nucleares para o aumento da cobertura dos trabalhadores pelas convenções coletivas são uma solução administrativa que contribui para a diminuição do número de sindicalizados em Portugal.
 
Sendo um instrumento legal, destinado a complementar a negociação coletiva entre sindicatos e empregadores, as PE visam cumprir os preceitos constitucionais no que concerne ao papel dos sindicatos na negociação coletiva bem como às normas vertidas no Código de Trabalho, fornecendo assim tratamento igual a todos os trabalhadores de um dado setor de atividade, independentemente de serem sindicalizados ou não ao qual acresce o combate a “concorrência desleal” dentro do mesmo sector económico.
 
As PE, após o período de congelamento ocorrido desde 2011 até praticamente 2015, quase triplicaram entre 2016, onde foram contabilizadas 35, e 2017 onde se registaram 84.

Embora em 2018, só tenhamos números até outubro, com 65 PE contabilizadas, poderão chegar a cerca de 78 até ao final do ano, número muito próximo do verificado em 2017, o que demonstra um reforço da utilização desta ferramenta administrativa como uma das alavancas da negociação coletiva na linha da importância que anteriormente teve, nomeadamente no período pré-troika.

Quanto ao trabalhadores no ativo potencialmente abrangidos pelos diversos instrumentos de regulamentação coletiva, segundo a DGERT-MTSSS, o seu número, depois de ter descido de forma abrupta em 2012 e 2013 com a expressão mínima em 2014, altura em que se registaram 246.643 trabalhadores, tem vindo, desde aí, em crescendo, cifrando-se em 820.883 trabalhadores em 2017.

Estamos assim, fruto da melhoria da dinâmica contratual, mas igualmente do aumento acentuado das portarias de extensão, no cumprimento da permissão do Código de Trabalho, no seu art.º 485º, elaborada à luz do disposto na Constituição da República Portuguesa no n.º 3 do seu artigo 56.º que atribui aos Sindicatos o papel fundamental na negociação coletiva.

Por contraponto a esta escalada de importância das diversas formas de IRCT, temos a acelerada redução do número de trabalhadores sindicalizados, que, conforme expresso no Livro Verde Sobre as Relações Laborais – atualização janeiro de 2018 - da responsabilidade do GEP-MTSSS, se situava em 2016 no valor médio de 8,3% sobre os trabalhadores ativos.

Mesmo admitindo que estes dados são obtidos diretamente das informações fornecidas pelas empresas sobre a filiação sindical e que, por isso, podem acrescer a estes números os trabalhadores que estão sindicalizados sem conhecimento da empresa, e ainda os trabalhadores funcionários públicos sindicalizados, embora estes não sejam igualmente abrangidos pelas PE, não andaremos muito longe da verdade, se apontarmos que a taxa efetiva de sindicalização deverá hoje oscilar entre os 10% e os 12% da população ativa por conta de outrem (1) isto é entre  cerca de 400.000 a 480.000 trabalhadores.

Contudo, num estudo de 2013 do Banco de Portugal (2), tomando como base em dados de 2010, referentes a cerca de 2,3 milhões de trabalhadores por conta de outrem, foi obtida a taxa média de sindicalização de 10,9% com tendência a decrescer em linha com a evolução anteriormente verificada.

Ora, se é verdade, conforme os autores concluíram nesse mesmo estudo, que os trabalhadores das empresas mais fortemente sindicalizadas auferiam em média mais cerca de 30% do que é auferido pelos trabalhadores em empresas com baixa sindicalização, não é menos verdade que a taxa de sindicalização nas grandes empresas financeiras, seguradoras e de distribuição energética, onde certamente o efeito das PE não se faz sentir, é superior a 60%, descendo abruptamente para percentagens em torno dos 10% e menos, em todas as outras atividades, que pela sua natureza e dispersão as fazem estar mais envolvidas nas extensões administrativas dos IRCT.

O tema da sindicalização e das PE tem sido alvo de abordagens nos media, nomeadamente em artigos do Expresso (3), no Jornal de Negócios (4) e no Público (5). Se em todos é clara a abordagem da redução da sindicalização e a importância das PE para o aumento da taxa de cobertura das convenções coletivas sobre os trabalhadores no ativo, não é, no entanto, abordado de forma conclusiva o eventual efeito das mesmas na contribuição para a redução da sindicalização que se verifica.

Aqui chegados importa clarificar a resposta positiva que demos ao pagamento de um valor aos sindicatos que negociaram a convenção que deu origem à PE e às reservas que sobre essa matéria alguns poderão fazer.

O código de trabalho em vigor prevê, já hoje, no número 4 do art.º 492, que uma dada convenção coletiva possa estatuir uma comparticipação por parte de um trabalhador, quando ao abrigo do artigo 497.º este efetue a escolha entre uma ou mais convenções coletivas ou arbitrais.  Temos assim que o CT já hoje acolhe a possibilidade de uma comparticipação por parte do trabalhador não sindicalizado, não sendo por isso, este tema, completamente estranho ao legislador.

O que haveria a acrescentar é que, ao abrigo de uma PE que decorra de anterior negociação sindical, e somente nestes casos, os trabalhadores que desejem ser abrangidos pela mesma, teriam de o expressar, aceitando-a e, com isso, pagar anualmente, por todo o período de vigência da convenção estendida, um valor que corresponda, pelo menos a 10% do salário mínimo, facilitando assim o mecanismo de atualização futura desta norma.

Esta alteração que, obviamente, colocava um ponto final no automatismo da aplicação das PE hoje existente, reforçava os princípios constitucionais no que concerne ao papel das associações sindicais, através da dotação financeira essencial para a manutenção das mesmas, mas também na resposta à dúvida por parte do trabalhador se deverá somente contribuir para estar abrangido pela convenção ou se deverá ser associado do sindicato subscritor passando assim a ter uma cobertura sindical muito mais ampla e, finalmente, caminhava, no sentido já hoje previsto no Código do Trabalho, de uma contribuição extraordinária do trabalhador não sindicalizado.

(1)    3.948,700 trabalhadores por conta de outrem. 2017. PORDATA/INE

(2)    Portugal, Pedro e Vilares, Hugo. 2013. Sobre os Sindicatos, A Sindicalização e o Prémio Sindical.

(3)    Expresso, 1.5.2018. Lourenço, Sónia M.  S. Ainda vale a pena ser sindicalizado?

(4)    Jornal de Negócios. 25.1.2018. Esteves, Manuel. Taxa de Sindicalização no setor privado volta a cair

(5)    Público. 3.8.2014. Carneiro, Joana. O Emprego e as portarias de extensão

 
Carlos A. Marques

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